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Copa 2014 e a Amazônia devastada
São Paulo, 03 de julho de 2014, quinta-feira
Revisão e atualização feita em 04 de julho de 2014.


O patriotismo dos brasileiros à flor da pele. São as bandeirinhas verde e amarelo por todos os cantos. As pessoas com as camisetas da Seleção Brasileira, os carros com a bandeira nas capotas, as fachadas dos apartamentos com as bandeiras, e até os cachorrinhos com algum apetrecho verde e amarelo. Em uma padaria perto da casa, aproveitou-se a réplica da Estátua da Liberdade, que é a marca do estabelecimento, para vesti-la com as cores verde e amarelo. O seu dono, um português, também vestiu-a na cor verde e vermelho, no jogo entre Portugal e os Estados Unidos. Mas isto não salvou a seleção portuguesa da desclassificação mais adiante.


O que surpreende é que o rosto da estátua,
diferentemente da original, é etnicamente brasileiro.

Neste mesmo estabelecimento, no dia em que o Brasil joga, são vendidos bolos de doces nas cores verdes, amarelos e azuis. Evidentemente que eu não arriscaria em experimentar as azuis ftalos e nem as verdes kriptonitas. Cores estas estranhas para quaisquer alimentos.

Desde a década de 80 eu acompanhei as Copas, à distância. Mas a princípio, fazendo apenas os ensaios fotográficos, no intuito de me firmar como fotojornalista. E naquela época, eu me envolvia emocionalmente. Desta vez, preferi observar os comportamentos dos torcedores entusiastas, para fazer comparações com outros comportamentos, e que de uma certa forma me chamava a atenção

A poucas horas do evento, quando a nação inteira participa, os supermercados ficam lotados de gente, preenchendo o espaço com as cores nacionais. Muitos compram carnes para churrascos, acompanhados de cervejas, pipocas e salgadinhos. E o ambiente fica colorido de verde e amarelo por todos os lados. Trata-se de um tipo de ritual de ordem global. Pois, seria difícil ignorar que o mesmo fenômeno não ocorra em outras partes do mundo, em que tem participações nos jogos.

Certamente que é um envolvimento de massa, altamente contagiante, em que as emoções unem as pessoas, num patriotismo exaltado mas passageiro. Pois, em um destes supermercados, e em outras ocasiões, várias vezes reparei a baixa civilidade dos cidadãos: Carrinhos no meio dos corredores, atrapalhando quem que precisa passar. Mercadorias tiradas das geladeiras e colocadas em prateleiras que não contenham refrigeração... e até um copo de requeijão em um compartimento quente para frangos assados! E, em outra ocasião, uma garota com a perna engessada, experimenta as cerejas de uma embalagem que ela acabou de rasgar. Gostando do produto, ela resolveu levar a outra embalagem, intacta, deixando a que ela rasgou de lado.

Evidentemente que são comportamentos relativamente cegos e alienados. Pois, seria muito difícil acreditar que alguém tomasse atitudes pouco civilizadas com o intuito de prejudicar, seja lá quem fosse.

Em contrapartida, o que impressiona mesmo são as discussões depois de cada jogo: Por que é que não foram feitos os gols? O que precisam fazer para melhorar as jogadas? Como vencer o adversário? Tudo dentro de um clima sério. Como se estivessem tomando decisões em tempos de guerra. Imagino que se essa dedicação fosse aplicada para discutir sobre reformas tributárias, reformas judiciárias, reformas políticas, reformas trabalhistas etc., este país atingiria em pouco tempo, o patamar do primeiro mundo, como na Suécia, na Finlândia, na Suíça etc.

Supõe-se que os jogos, tal como as viradas culturais, que acontecem na capital paulista e outros, fazem parte da política de pão e circo: O pão, seriam as bolsas famílias e outros benefícios oferecidos à população. E o circo, uma forma de desviar a atenção dos problemas atuais, entretendo o povo e fazendo com que estravazem suas energias e tensões em questões que nada edificam ou beneficiam a própria sociedade. Isto é histórico, pois sempre ocorreu no passado, e não seria diferente agora. Então, discutir sobre esse tipo de manipulação seria na verdade uma perda de tempo.

A questão é o comportamento duplo e aparentemente desconexo da população: De um lado, esse patriotismo contagiante, em que todo mundo se veste de verde e amarelo. E do outro, a falta imensa de civilidade, acompanhada de um enorme comportamento que denota passividade e alienação. Existem outras observações, e que reforçam essa minha observação.

Um belo exemplo, no meu entender, da passividade e da alienação, é justamente a indiferença em relação à destruição sistemática da Amazônia. Dois anos atrás, por um acaso, percebi que algo de anormal estava acontecendo naquela região. Isto através do Google Maps, que permitiu visualizar as imagens tiradas pelos satélites. Capturei aquelas que consideravam cruciais, e desenvolvi um trabalho sobre o assunto. E publiquei-o. O artigo foi este:

http://zadoque.com/cidadania/Amazonia-devastada-01.php

Depois da publicação, usei a rede social Twitter para notificar o pessoal. Ninguém deu a atenção. O que me levou a concluir que não estão nem aí. Se o Brasil perdesse a metade do seu território, o pessoal aceitaria e sem nenhum problema. Isto me levou às seguintes hipóteses:

  1. A formação do povo brasileiro sempre teve um histórico de mentalidade extrativista: Diferentemente das colônias anglo-saxãs, aonde O Novo Mundo é visto como uma nova promessa a ser construida, as colônias de origem luso-hispânica foram vistas como fontes de riquezas a serem exploradas. Evidentemente que haviam os interesses econômicos nas colônias britânicas, assim como também os interesses em fazer uma nova vida aqui no Brasil. Mas por algum motivo, prevalesceu a mentalidade extrativista aqui do que nessas colônias anglo-saxâs.
  2. A Educação foi sucateada, de modo que conceitos sobre patriotismo, soberania territorial, o bem comum, o pátrio poder etc., foram ignorados. Os jovens de hoje não têm essas noções. Considera-se que são resquícios militaristas. Além disso (ainda na parte da Educação), matérias como filosofia, latim (e grego), duas línguas estrangeiras pelo menos e educação musical (Villa Lobos) foram retiradas do currículo ou deixadas de lado. Conseqüentemente as novas gerações carecem de raciocínio crítico, conceitos fundamentados de civilidade, noções do valor da pátria, sensibilidade musical e artística (o que dão em funks...) etc.
  3. Os valores judaico-cristã foram menosprezados, em detrimento aos novos valores da pos-modernidade. A própria relação de trabalho, aonde houve a participação da mulher, foi um dos elementos cruciais dessa alteração. A contra cultura influenciou as novas gerações a partir dos anos 60. Nesse caso, o problema é global, de modo que encontram-se os mesmos comportamentos em várias partes do mundo.
  4. O brasileiro é covarde. Isto deveu-se à própria formação, desde o tempo da colônia, quando houve várias repressões cruéis, por parte de elites poderosas. E depois, com o advento da repressão militar, houve perseguições e torturas. O que levou o povo a uma passividade, para poupar-se das situações constrangedoras.
  5. O brasileiro é macunaíma (Mário de Andrade), produto de mistura de raças e culturas. E tem uma visão do mundo que o leva à acomodação, frente a situações inusitadas.
  6. Outras hipóteses a serem consideradas.

Certamente que a confirmação das hipóteses demanda tempo, o que dará em vários textos a serem desenvolvidos e publicados.


Vista esta camisa!

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